O RECALL, OU A DESELEIÇÃO E REMOÇÃO DOS PARLAMENTARES IRRESPONSÁVEIS

Ele se levantou da cadeira, de braços erguidos e abertos, “vou te dar um beijo”, aproximou-se de mim, continuei sentado, beijou-me. Exultava de felicidade, iluminara-se, compreendeu a importância e a oportunidade política de iniciar uma campanha de iniciativa popular de lei para introduzir o RECALL no Brasil.

Sérgio Storch é amigo de mais de vinte anos. Engenheiro altamente qualificado, ocupado com a gestão do conhecimento, é também um ativista político sério, que quer o bem comum do povo brasileiro e o aperfeiçoamento das instituições democráticas. Havia me telefonado para consultar-me sobre se seria possível revogar o aumento de mais de sessenta por cento que os parlamentares se autoconcederam, presente de Natal aos cidadãos trabalhadores.

Silvia Paletta Cardoso Sica, administradora, literata e excelente corretora de textos, acompanhou a nossa reunião no Cristallo do Pátio Higienópolis, produtiva, pois, em uma hora delineamos a campanha. WIKICAN, nós podemos, através da plataforma WIKI, liderar a aprovação da remoção dos políticos irresponsáveis.

Primeiro, relatei-lhe o projeto de iniciativa popular de lei contra a legislação em causa própria dos parlamentares datada de 1990, campanha que coordenei com meus alunos da FMU. O Jornal da Tarde, Celso Kinjo era o editor, se não me falha a memória, levantou a campanha que tomou conta do Brasil. O resultado foi a primeira emenda à Constituição de 1988, por iniciativa parlamentar do Senador Nelson Carneiro, ancorado pelo clima político então criado por nós através da mídia. Milhares de assinaturas foram recolhidas e fundamos a Associação Iniciativa Popular.

Não disse ao Sérgio que o Aloysio Nunes, à época, me disse que eu ficara queimado com os políticos. Eles não teriam gostado nada da campanha. Comentei apenas que o José Dirceu, ao me apresentar a uns cupinchas dele, afirmou que eu era o seu colega do Direito da PUCSP que queria acabar com o salário dos deputados. Eu respondi desejar, apenas, a elevação do salário mínimo, já que a nossa proposta congelava a remuneração dos parlamentares federais em vinte vezes o mínimo.

Remeti o Sérgio à entrevista que dei em 1999 e que pode ser lida clicando o ícone da INICIATIVA POPULAR na minha página, a fim de que ele se inteirasse da avaliação que eu mesmo fiz a respeito daquela maravilhosa campanha.

E mais. Chamei a atenção para o fato de que o salário médio do brasileiro está em torno de R$ 1382, 00 e que os R$ 26 mil e pouco dos parlamentares corresponde a vinte vezes este salário médio. O fato é que o salário mínimo atual está mais para o marxista, próximo do valor da cesta básica do que do salário mínimo constitucional, do art. 7º, inciso IV da CF/88, que o DIEESE calcula em valor superior a R$ 2.000,00.

Foi aí que comecei a defender o RECALL como sendo o desejo dos cidadãos. Poder deseleger, a fim de que não possa ficar pior, poder remover os políticos que não respondem juridicamente aos eleitores. Afirmei que a irresponsabilidade política punida com a não reeleição do parlamentar tornou-ser insuficiente para os cidadãos, em face do amadurecimento democrático. Além da ficha-limpa e de candidatos que não comprem votos, os cidadãos querem parlamentares responsáveis.

Expliquei-lhe, então, que havia conversado neste Natal com a colega de magistério no Mackenzie, Maria Lúcia de Barros Rodrigues, uma pós-doutora em propriedade intelectual. E que ela concordara comigo sobre a conveniência da iniciativa popular de lei para DESELEGER os parlamentares irresponsáveis.Achara boa, ademais, a idéia de que a DESELEIÇÃO se desse a cada dois anos, relativamente a quem estivesse em meio ao seu mandato, por ocasião das eleições marcadas pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Assim, mediante a aprovação desta lei de iniciativa popular o TSE ficaria obrigado a providenciar esta possibilidade do cidadão DESELEGER os parlamentares irresponsáveis juridicamente. O eleitor passaria a eleger alguns para iniciar mandatos e DESELEGERIA outros que julgasse não merecedores de continuar auferindo os recursos pagos pelo povo. Sugeri que seria DESELEITO o parlamentar que recebesse o mesmo número de votos com os quais se elegeu.

Referi-me ao recall existente hoje no estado americano da Califórnia e na Constituição Alemã de Weimar, de 11 de agosto de 1919.

Contei, então, que justamente agora estamos renovando os estatutos da Associação Iniciativa Popular, com o Francisco Petros,a Maria Lúcia, o Guilherme Mendes, seus amigos e o José Maria Godoi. Convidei-o para ingressar e ele aquiesceu.

Neste 28 de dezembro de 2010, pode ter nascido a quarta campanha de iniciativa popular de lei, agora, para REMOVER parlamentares que não honram os cidadãos eleitores do Brasil.

Comentários

Sérgio Storch disse…
Marcos, esse relato está fidelíssimo. Uma pequena falha: você trouxe o tema "recall" para me pacificar quando eu mostrei indignação ao dizer que o deputado em quem votei tinha apoiado aquele aumento insultuoso.
Grande post. Acho que foram instantes de fazer História.
Davi Gonçalves disse…
Digno de sua pessoa, professor. Sempre um visionário político. Orgulho em ter sido seu discente. Torço também pelo recall.
Marcos Peixoto disse…
De fato, Sérgio, tentei mostrar que a questão do custo da representação política já possui o teto da remuneração dos ministros do STF. Sobreleva, entretanto, a questão da desigualdade educacional e socioeconômica que tem de ser atacada.
Unknown disse…
Bela explanação e ótimo tema. Nossos políticos envergonham a imagem deste país e continuam manchando nossa história. O egoísmo do ser humano (que deveria ser muito mais controlado por pessoas cultas, que teoricamente deveriam gerir a sociedade no interesse do povo), está cada vez mais presente no meio político. Isso é um absurdo. O salário dos representantes do povo deveria ser baseado proporcionalmente no aumento do salário mínimo. Acredito que a proposta de remoção de parlamentares pode gerar certa instabilidade política, mas se a proposta estiver bem redigida pode driblar este inconveniente e muito me agrada a idéia. Me fale como posso ajudar e onde devo assinar para apoiar esta iniciativa. Estou distribuindo a notícia em questão a amigos e colegas.
Francisco Petros disse…
Mestre Peixoto,

Excelente iniciativa e artigo sobre o assunto. Há nele modernidade e compreensão da política nestes novos tempos. Como vamos agir?

Francisco Petros
Acredito que depois desses parcos anos de democracia, nós, brasileiros, estamos começando a entender que podemos participar da política, sem estarmos na política.
Por esse caminho, e passo a passo, quem sabe não consigamos fazer parte da tão almejada reforma política que os políticos relutam em fazer. Parabéns por nos abrir esse caminho.

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