ANTICAPITAL, BURRICE OU IGNORÂNCIA?
1966. Acabáramos de voltar, trazendo a vitória
conquistada no I Festival Internacional de Teatro Amador realizado em Nancy, no
sul da França, onde concorremos com a peça “Morte e Vida Severina”, de João
Cabral de Mello Neto, música de Chico Buarque. Segundo crônica da psicanalista
Maria Rita Khel, o TUCA fora, então, uma unanimidade.
Pois bem. Meu
querido e falecido amigo, colega de classe na Faculdade de Direito da PUCSP
desde 1964, Luiz Gonzaga da Rosa Travassos, o maior líder estudantil do período
64/68, naquele agosto de 1966 dedicou várias horas para me convencer a assumir
o jornal da União Estadual dos Estudantes UEE, que ele presidia, antes de
assumir a UNE em 1967,
Travassos não
se conformava com a minha decisão de passar as tardes na biblioteca da faculdade,
preparando o trabalho “Direito Positivo e Direito Natural”, com o qual
concorreria ao I Concurso de Trabalhos Jurídicos organizado pelo CEPEU, Centro
de Pesquisas Universitárias, ligado ao Reitor Oswaldo Aranha Bandeira de Mello,
sob a direção do Professor Doutor Rafael Llano Cifuentes.
Travassos não conseguia entender, dizia, o
que teria acontecido comigo. Perguntava-se e a mim diretamente, como uma pessoa
com o nível de consciência histórica que eu tinha, ou que nós achávamos que eu
tivesse, podia perder tempo com estudos que não serviriam para combater o
capitalismo!
E eu me
defendia dizendo que sim, apesar de reconhecer a necessidade de combater o
capitalismo, também sentia uma outra necessidade: a de aprofundar os meus
conhecimentos.
Toda esta
lembrança para afirmar que a minha decisão se revelou correta. Sim, fui ficando
mais crítico e pude perceber as manipulações ideológicas da época. Uma das
conseqüências foi não aderir à luta armada, que julguei uma porraloquice,
como dizíamos então. E, obviamente, eu estava certo.
O que me
motiva agora é denunciar a hipostatização da idéia de capital. Significa tomar
a idéia de capital e transforma-la em um ente existente em si e por si, fora da
mente, como se a idéia de capital tivesse existência própria, para além do
mundo físico. Ou seja, fazer do capital uma metafísica.
Faço esta
afirmação porque segundo me parece, capital é mero instrumento de produção.
Todo e qualquer instrumento de produção. Lembro-me da lição de Pinto Antunes,
meu professor na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, da USP. Dizia:
“quando o índio usa uma vara para apanhar frutos que não alcança com as mãos,
usa capital”. Ou seja, um mero instrumento para aumentar a sua produtividade na
colheita de frutos. Claro, o capital sofisticou-se com as invenções. Um dos
mais influentes da atualidade é, sem dúvida alguma, a Internet, mero
instrumento de produção, capital, pois.
A grande
novidade, entretanto, é que a Internet é um capital que pertence a todos, um
instrumento de produção da humanidade, bem comum da espécie, bem comum de todos
os povos, uma vez que não é um bem passível de ser objeto de propriedade, seja
do indivíduo, seja das empresas, seja dos Estados.
Em conclusão:
ser anticapital significa ser contra os instrumentos de produção, uma enorme
burrice, senão, ignorância lamentável. Entretanto, é preciso distinguir os
tipos de capital e os setores que os manejam, explorar as contradições
existentes entre eles, com um objetivo: libertar o ser humano da mera condição
de capital, de mero instrumento de produção, de mera coisa chamada de recurso
humano que apenas serve para alugar a sua força de trabalho aos donos do
capital. Utopia? A Internet pode ajudar!
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